segunda-feira, 25 de março de 2013

NECESSIDADE DAS BOAS OBRAS

Não pode haver dúvida quanto à necessidade das boas obras, corretamente entendida. Não as podemos considerar como necessárias para merecimento da salvação, nem como meios pelos quais segurar a salvação, nem ainda como o único caminho pelo qual seguir rumo à glória eterna, pois as crianças dão entrada à salvação sem terem praticado nenhuma boa obra. A Bíblia não ensina que ninguém pode salvar-se sem boas obras. Ao mesmo tempo, as boas obras decorrem necessariamente da união dos crentes com Cristo.”Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto”, Jo 15.5. Elas são necessárias também porque exigidas por Deus, Rm 7.4; 8.12, 13; Gl 6.2, como frutos da fé, Tg 2.14, 17, 20-22, como expressões de gratidão, 1 co 6.20, como conducentes à segurança da fé, 2 pe 1.5-10, e para a glória de Deus, Jo 15.8; 1 co 10.31. Deve-se defender a necessidade das boas obras contra os antinomianos, que alegam que, desde que Cristo não somente levou sobre Si a pena do pecado, mas também satisfez as exigências positivas da lei, o crente está livre da obrigação de observa-la, erro que ainda está conosco hoje em dia, nalgumas formas de dispensacionalismo. Esta é uma posição completamente falsa, pois somente como sistema de penalização e método de salvação é que a lei é abolida na morte de Cristo. Como padrão para a nossa vida moral, a lei é uma transcrição da santidade de Deus e, portanto, tem validade permanente para o crente também, apesar de que a sua atitude para com a lei passou por uma transformação radical. Ele recebeu o Espírito de Deus, que é o espírito de obediência, de sorte que, sem nenhum constrangimento, ele obedece voluntariamente à lei. Strong resume bem isso, quando diz: Cristo nos livra: “(1) da lei como um sistema de maldição e penalidade; isto Ele faz levando sobre Si a maldição e a penalidade...; (2) da lei com as suas exigências como método de salvação; isto Ele faz tornando nossos a Sua obediência e os Seus méritos...; (3) da lei como compulsão externa e alheia; isto Ele faz dando-nos o espírito de obediência e de filiação, pelo qual a lei é realizada progressivamente dentro em nós”.[1]
QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Como a santidade teocrática se relacionava com a santidade ética entre os israelitas? 2. Como a purificação ritual se relacionava com a santificação? 3. Quem é o sujeito da santificação, o velho homem, ou o novo, ou ambos? 4. A santificação nesta vida afeta igualmente todas as partes do homem? 5. Onde começa o processo de santificação? 6. Todos os cristãos experimentam um constante progresso na santificação? 7. Qual a diferença entre santificação e melhoramento moral? 8. O fato de que a santificação nunca é completa nesta vida leva necessariamente à doutrina do purgatório, ou à doutrina da santificação depois da morte? 9. Como concebe Wesley “Santificação Integral”? 10. Barth também atribui ao crente a santidade no sentido de qualidade ética? 11. Que prova bíblica existe de que o cristão não está livre da lei como norma de vida? 12. Os protestantes em geral ensinam que as boas obras não são necessárias? 13. Como diferem os católicos romanos e os protestantes quanto à necessidade das obas obras? 14. É sábio dizer, sem nenhuma ressalva, que as boas obras são necessárias para a salvação? 15. Se todos os cristãos herdam a vida eterna, em que sentido as suas obras servirão de padrão para a sua recompensa?
BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. IV, p. 245-288; Kuyper, Dict. Dogm., De Salute, p. 134-157; ibid., Het Werk van den Heiligen Geest III, p. 1-123; Vos, Geref. Dogm. IV, p. 211-248; Hodge, Syst. Theol. III, p. 213-258; Shedd, Dogm. Theol. II, p. 553-560; Dabney, Syst., and Polem. Theol., p. 660-687; Strong, Syst. Theol., p. 869-881; Alexander, Syst. Of Bibl. Theol. II, p.428-459; Litton, Introd. To Dogm. Theol., p. 322-337; Schmid, Doct. Theol. Of the Luth. Church, p. 491-503; Valentine, Chr. Theol. II, p. 272-277; Pieper, Chr. Dogmatik III, p. 1-106; Watson, Theol. Institutes III, p. 197-206; Curtis, The Chr. Faith, p. 373-393; Pope, Chr. Theol. III, p. 28-99; Candlish, The Chr. Salvation, p. 110-133; Impeta, De Leer der Heiliging and Volmaking bij Wesley and Fletcher; Clarke, An Outline of Chr. Theol., p. 409-427; Wilmers, Handbook of the Chr. Rel., p. 293-304; Moehler, Symbolism, p. 157-175; Finney, Syst. Theol., p. 402-481; Starbuck, The Psych. Of Rel., p. 375-391; Koberle, The Quest of Holiness; Warfield, Studies in Perfectionism (2 volumes); Newton Flew, The Idea of Perfection in Christian Theology.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.545)


[1] System. Theol., p. 876.

A Perseverança dos Santos

A. A Doutrina da Perseverança dos Santos na História.

A doutrina da perseverança dos santos tem o sentido de que aqueles que Deus regenerou e chamou eficazmente para um estado de graça não podem cair nem total nem definitivamente, mas certamente perseverarão nele até o fim e serão salvos para toda a eternidade. Quem primeiro ensinou explicitamente esta doutrina foi Agostinho, embora não fosse coerente neste ponto, como se poderia esperar dele, um rigoroso predestinacionista. Com ele a doutrina não assumiu a forma exposta acima. Ele sustentava que os eleitos não podem cair de modo que se percam definitivamente, mas, ao mesmo tempo, achava possível que alguns que foram revestidos da nova vida e da fé verdadeira possam cair completamente da graça e, por fim, sofrer a condenação eterna. A igreja de Roma, com o seu semipelagianismo, inclusa a doutrina do livre arbítrio, negava a doutrina da perseverança dos santos e colocava a perseverança destes na dependência da incerta obediência do homem. Os Reformadores restabeleceram esta doutrina, colocando-a no seu devido lugar. Contudo, a Igreja Luterana voltou a faze-la incerta, atribuindo-lhe dependência da contínua atividade da fé, por parte do homem, e pressupondo que os crentes verdadeiros podem cair completamente da graça. Somente nas igrejas calvinistas é que a doutrina é defendida numa forma que lhe dá segurança absoluta. Os Cânones de Dort, depois de chamarem a atenção para as muitas fraquezas e faltas dos filhos de Deus, declaram: “Mas Deus, que é rico em misericórdia, segundo o Seu imutável propósito de eleição, não retira totalmente o Espírito Santo do Seu povo, mesmo em suas graves quedas; nem consente que cheguem ao ponto de perderem a graça da adoção e serem provados do estado de justificação, ou de cometerem pecado para a morte ou contra o Espírito Santo; tampouco permite que eles fiquem totalmente desamparados e se precipitem na destruição eterna”.[1] Os arminianos rejeitaram este conceito e proclamaram que a perseverança dos crentes depende da sua vontade de crer e das suas boas obras. Pessoalmente, Armínio evitou esse extremo, mas os seus seguidores não hesitaram em manter a sua posição sinergista, com todas as suas conseqüências. Os arminianos wesleyanos seguiram esse rumo, e assim também várias outras seitas. As igrejas reformadas calvinistas ficam praticamente sozinhas na atitude de responder negativamente a indagação sobre se o cristão pode cair completamente do estado de graça e perder-se definitivamente.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.546)


[1] V. Art. 6.

Exposição da Doutrina da Perseverança

A doutrina da perseverança exige exposição cuidadosa, principalmente em vista do fato de que a expressão “perseverança dos santos” está sujeita a ser mal compreendida. Devemos observar primeiramente que a doutrina não pretende ensinar apenas que os eleitos serão certamente salvos no final, embora Agostinho lhe tenha dado essa forma, mas ensina mui especificamente que aqueles que uma vez foram regenerados e chamados eficazmente por Deus para um estado de graça, jamais poderão cair completamente desse estado e, daí, deixar de alcançar a salvação eterna, apesar de poderem, às vezes, ser dominados pelo mal e cair em pecado. Afirma-se que a vida própria da regeneração e os hábitos que dela se desenvolvem nas veredas da santificação jamais poderão desaparecer inteiramente. Além disso, devemos proteger-nos do possível mal-entendido, segundo o qual, esta perseverança é considerada como uma propriedade natural do crente, ou como uma atividade contínua do homem, por meio da qual ele persevera no caminho da salvação. Quando Strong a descreve como “a continuação voluntária, da parte do cristão, na fé e na prática do bem”, e como “o lado ou aspecto humano do processo espiritual que, visto do lado divino, denominamos santificação” – por certo isso está sujeito a criar a impressão de que a perseverança depende do homem. Os reformados, porém, não consideram a perseverança dos santos como sendo,a cima de tudo, uma disposição ou atividade do crente, embora certamente creiam que o homem coopera nela, exatamente como coopera na santificação. Eles até acentuam o fato de que o crente cairia, se fosse deixado entregue a si mesmo. Estritamente falando, é Deus quem persevera, não o homem. Pode-se definir a perseverança como a contínua operação do Espírito Santo no crente, pela qual a obra da graça divina, iniciada no coração, tem prosseguimento e se completa. É porque Deus nunca abandona a Sua obra que os crentes continuam de pé até o fim.

(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.547)

Prova da Doutrina da Perseverança

Pode-se provar a doutrina da perseverança com certas afirmações da Escritura e mediante a inferência doutras doutrinas.

1. AFIRMAÇÕES DIRETAS DA ESCRITURA. Há algumas passagens importantes da Escritura que consideraremos aqui. Em Jo 10.27-29 lemos: “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão, eternamente, e ninguém as arrebatará da minha mão. Aquilo que meu Pai me deu é maior do que tudo; e da mão do Pai ninguém pode arrebatar”. Em Rm 11.29 diz o apóstolo Paulo: “Porque os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis” (ou, na versão utilizada pelo Autor, “são sem arrependimento”). Quer dizer que a graça de Deus revelada em Sua vocação nunca mais é retirada, como se Deus se arrependesse de havê-la dado. Esta afirmação é de caráter geral, embora no contexto em que se acha à vocação de Israel. O apóstolo consola e fortalece os crentes de Filipos com as palavras: “Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao dia de Cristo Jesus”, Fp 1.6. Em 2 Ts 3.3 ele diz: “Todavia o Senhor é fiel; ele vos confirmará e guardará do maligno”. Em 2 Tm 1.12 ele faz soar uma nota de regozijo: “... porque eu sei em quem tenho crido, e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele dia”. E em 4.18, na mesma epístola, Paulo de gloria [e dá glória a Deus] pelo fato de que o Senhor o livrará de toda obra maligna e o levará a salvo para o Seu reino celestial.
2. PROVAS POR INFERÊNCIA. Também se pode comprovar a doutrina da perseverança por inferência.
a. Da doutrina da eleição. A eleição não significa apenas que alguns serão favorecidos por certos privilégios externos e poderão ser salvos, se cumprirem com o seu dever, mas, sim, que aqueles que pertencem ao número dos eleitos serão finalmente salvos e nunca ficarão aquém da salvação perfeita. É eleição para um fim, a saber, para a salvação. Ao levá-la a efeito, Deus reveste os crentes de influências do Espírito Santo que os levam, não somente a aceitar a Cristo, mas também a perseverar até o fim e a salvar-se para a eternidade.
b. Da doutrina da aliança da redenção. Na aliança da redenção Deus deu o Seu povo ao Seu filho como recompensa pela obediência e pelo sofrimento Deste. Esta recompensa foi estabelecida na eternidade pretérita e não foi submetida à condição de alguma fidelidade incerta do homem. Deus não volta atrás, em Sua promessa, e, portanto, é impossível que aqueles que são considerados como unidos a Cristo e como partes da Sua recompensa, possam separar-se dele (Rm 8.38, 39), e que aqueles que ingressaram na aliança, entendida como uma comunhão vital, caiam e sejam eliminados dela.
c. Da eficácia dos méritos e da intercessão de Cristo. Em Sua obra expiatória, Cristo pagou o preço necessário para adquirir o perdão e a divina aceitação do pecador. A justiça de Cristo constitui a base perfeita para a justificação do pecador, e é impossível que aquele que é justificado pelo pagamento de um preço tão perfeito e eficaz fique de novo debaixo da condenação. Ademais, Cristo faz constante intercessão por aqueles que Lhe são dados pelo Pai, e a Sua oração intercessória por Seu povo é sempre eficaz, Jo 11.42; Hb 7.25.
d. Da união mística com Cristo. Os que estão unidos a Cristo pela fé, tornam-se participantes do Seu Espírito e, assim, tornam-se um corpo com Ele, pulsando neles a vida do Espírito. Compartem a vida de Cristo, e, porque Cristo vive, eles vivem também. É impossível que eles sejam retirados do corpo e, assim, frustrem o ideal divino. A união é permanente, visto que se origina numa causa permanente e imutável – o livre e terno amor de Deus.
e. Da obra que o Espírito Santo realiza no coração. Diz corretamente Dabney: “É uma inferior e indigna avaliação da sabedoria do Espírito Santo e da Sua obra no coração humano, supor que Ele comece a obra agora e, logo em seguida, a abandone; que a centelha vital do nascimento celestial seja um ignis fatuum (fogo fátuo), ardendo por um pouco e depois expirando na escuridão total; que a vida comunicada no novo nascimento seja uma espécie de vitalidade espasmódica e galvânica, dando a aparência exterior de vida à alma morta, e depois morrendo”.[1] Segundo a Escritura, já nesta vida o crente está de posse da salvação e da vida eterna, Jo 3.36; 5.24; 6.54. Poderíamos partir da suposição de que a vida eterna não é eterna?
f. Da segurança da salvação. É evidente na Escritura que os crentes podem, nesta existência, alcançar a segurança da salvação, Hb 3.14; 6.11; 10.22; 2 pe 1.10. Isso estaria fora de questão, se fosse possível aos crentes cair da graça a qualquer momento. Essa segurança só pode ser desfrutada por aqueles que estão com a firme convicção de que Deus aperfeiçoará a obra que começou.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.549)


[1] Syst. and Polem. Theol., p. 692.

Objeções à Doutrina da Perseverança

1. NÃO SE HARMONIZA COM A LIBERDADE HUMANA. Dizem que a doutrina da perseverança é incoerente com a liberdade humana. Mas esta objeção parte da falsa pressuposição de que a verdadeira liberdade consiste na liberdade da indiferença, ou no poder de fazer escolha contrária em questões morais e espirituais. Contudo, isto é errôneo. A verdadeira liberdade consiste exatamente na autodeterminação rumo à santidade. O homem nunca é mais livre do que quando se move conscientemente em direção a Deus. E o cristão está com essa liberdade pela graça de Deus.

2. LEVA À INDOLÊNCIA E A IMORALIDADE. Assevera-se confiadamente que a doutrina da perseverança conduz à indolência, ao abuso e até à imoralidade. Dela resulta uma falsa segurança, é o que se diz. Esta é, porém, uma noção equivocada, pois, conquanto a Bíblia nos diga que somos guardados pela graça de Deus, ela não fomenta a idéia de que Deus nos guarda sem que de nossa parte haja constante vigilância, diligência e oração. É difícil ver como uma doutrina que garante ao crente uma perseverança na santidade pode ser um incentivo ao pecado. Quer-nos parecer que a certeza de sucesso na luta ativa pela santificação é o melhor estímulo possível para esforços cada vez maiores.
3. É CONTRÁRIA À ESCRITURA. Com freqüência se declara que a doutrina é contrária à Escritura. As passagens aduzidas para provar esta alegação podem ser reduzidas a três classes:
a. Há advertências contra a apostasia que pareceriam completamente sem razão de ser, se o crente não pudesse cair, Mt 24.12; Cl 1.23; Hb 2.1; 3.14; 6.11; 1 Jo 2.6. Mas estas advertências consideram a questão toda a partir do lado do homem e seu propósito é sério. Elas incitam os crentes ao exame de si mesmos e servem de instrumento para mantê-los no caminho da perseverança. Não provam que alguns dos seus destinatários irão apostatar da fé, mas simplesmente que o uso dos meios é necessário para impedi-los de cometer este pecado. Comparando-se At 27.22-25 com o versículo 31, tem-se uma ilustração deste princípio.
b. Também há exortações que concitam os crentes a permanecer no caminho da santificação, o que parece desnecessário, se não há dúvida de que eles permanecerão até o fim. Mas, geralmente, essas exortações acham-se ligadas a advertências do tipo das referidas no item (a), e atendem exatamente ao mesmo propósito. Elas não provam que quaisquer dos crentes exortados não perseverarão, mas somente que Deus utiliza meios morais para a realização de fins morais.
c. Dizem ainda que a Escritura registra diversos casos de apostasia concretizada, 1 Tm 1.19, 20; 2 tm 2.17, 18; 4.10; 2 pe 2.1, 2; cf. também Hb 6.4-6. Mas estes exemplos não provam a alegação de que os crentes verdadeiros, de posse da verdadeira fé salvadora, podem cair da graça, a não ser que se demonstre primeiro que as pessoas indicadas nestas passagens tinham a verdadeira fé em Cristo, e não uma simples fé temporal, não arraigada na regeneração. A Bíblia nos ensina que há pessoas que professam a fé verdadeira e que, todavia, não pertencem à fé, Rm 9.6; 1 jo 2.19; Ap 3.1. De alguns deles diz João: “Eles saíram do nosso meio”, e, à guisa de explicação, acrescenta: “entretanto, não eram dos nossos: porque, se tivessem sido dos nossos, teriam permanecido conosco”, 1 Jo 2.19.

E. A Negação Desta Doutrina Torna a Salvação Dependente da Vontade Humana.

A negação da doutrina da perseverança virtualmente torna a salvação do homem dependente da vontade humana, e não da graça de Deus. Naturalmente, esta consideração não terá efeito nenhum nos que partilham a concepção da salvação como auto-sotérica – e eles são numerosos – mas certamente deveria fazer com que parem para meditar aqueles que se gloriam em salvar-se pela graça. A idéia é que, depois que o homem é levado a um estado de graça unicamente pela operação do Espírito Santo, ou pela ação conjunta do Espírito Santo e da vontade do homem, cabe somente ao homem continuar na fé ou abandona-la, como lhe convenha. Isso torna a causa do homem muito precária e o impossibilita de obter a bendita segurança da fé. Conseqüentemente, é da máxima importância defender a doutrina da perseverança. Nas palavras de Hovey, “Ela pode ser uma fonte de grande consolação e poder – um incentivo para a gratidão, uma motivação para o sacrifício próprio e uma coluna de fogo na hora de perigo”.
QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Qual é a real questão concernente à perseverança: é se os eleitos ou se s regenerados perseveram? 2. Agostinho e os luteranos também ensinam que os eleitos poderão perder-se definitivamente? 3. Como a analogia da vida natural favorece a doutrina da perseverança? 4. Passagens como Hb 6.4-6; 10.29; 2 pe 2.1 não provam a possibilidade da queda definitiva? 5. Que dizer de Jo 15.1-6? 6. A graça da perseverança é alguma coisa inata, necessariamente dada com a nova natureza, ou é fruto de uma atividade especial, graciosa e preservadora de Deus? 7. A doutrina implica que a pessoa pode estar vivendo em pecado habitual e intencional e, contudo, estar num estado justificado? 8. Ela exclui a idéia de quedas em pecado?
BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. IV, p.289-294; Vos, Geref. Dogm. IV, p. 248-260; Dabney, Syst. And Polem. Theol., p. 687-698; Dick, Theology, Lect. LXXIX; Litton, Introd. To Dogm. Theol., p. 338-343; Finney, Syst. Theol., p. 544-619; Hovey, Manual of Theology and Ethics, p. 295-299; Pieper, Christ. Dogm. III, p. 107-120; Pope, Chr. Theol. III, p. 131-147; Meijering, De Dordtsche Leerregels, p. 256-354; Bos, De Dordtsche Leerregelen, p. 199-255.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.551)

A DOUTRINA DA IGREJA E DOS MEIOS DE GRAÇA

A IGREJA


A doutrina da aplicação dos méritos de Cristo leva naturalmente à doutrina da igreja, pois esta consiste dos que são partícipes de Cristo e das bênçãos da salvação que nele há. A concepção reformada (calvinista) é que Cristo, pela operação do Espírito Santo, reúne homens Consigo, dota-os da verdadeira fé e, assim, constitui a igreja como Seu corpo, a communio fidelium ou sanctorum (comunhão dos fiéis ou dos santos). Todavia, na Igreja Católica Romana o estudo da igreja tem precedência sobre tudo mais, antecedendo até ao estudo da doutrina de Deus e da revelação divina. O que se diz é que a igreja foi o instrumento da produção da produção da Bíblia e, portanto, tem precedência sobre ela; além disso, ela é despenseira de todas as graças sobrenaturais. Não é Cristo que nos leva à igreja, mas a igreja que nos leva a Cristo. Toda a ênfase recai, não sobre a igreja invisível como communio fidelium, mas sobre a igreja visível como mater fidelium (mãe dos fiéis). A Reforma rompeu com este conceito católico romano da igreja e centralizou a atenção na igreja como organismo espiritual, como outrora fora feito. Ela deu ênfase ao fato de que não existe igreja fora da obra de Cristo e das operações renovadoras do Espírito Santo; e ao fato de que, portanto, o estudo destas precede logicamente à consideração da doutrina da igreja.
Parece deveras peculiar que praticamente todos os dogmáticos presbiterianos exponenciais do nosso país,* como os dois Hodge, H.B.Smith, Shedd e Dabney não têm um lócus (uma parte) separado para o estudo da igreja em suas dogmáticas e, de fato, dedicam muito pouca atenção a ela. Somente as obras de Thornwell e Breckenridge constituem exceções à regra. Isto poderia dar a impressão de que, na opinião deles, a doutrina da igreja não deve ter lugar na dogmática. Mas isto é sumamente improvável, desde que nenhum deles levanta uma única objeção sequer à sua inclusão. Ademais, Turretino e os seus antecessores escoceses, sobre cujos alicerces aqueles teólogos edificam, deram muita atenção ao estudo da igreja. Diz Walker: “Não há talvez nenhum país no mundo em que todas as espécies de questões sobre a igreja foram examinadas como em nosso país”.[1] E, finalmente, o doutor A. A Hodge nos informa que o seu pai deu lições a suas diversas classes sobre temas eclesiológicos, cobriu praticamente o campo todo, e tencionava completar a sua Teologia Sistemática com a publicação de um quarto volume, sobre a igreja; mas foi impedido pelas enfermidades que lhe sobrevieram em sua avançada idade.[2] Diz Dabney que omitiu a doutrina da igreja porque esta recebia competente tratamento noutro departamento do Seminário* em que ele trabalhava.[3] Shedd, ao dar o seu plano, afirma que a igreja é focalizada em conexão com os meios de graça.[4] Contudo, ele dedica bem pouca atenção aos meios de graça e não ventila a doutrina da igreja. E o editor da obra de Smith, System of Christian Theology (Sistema de Teologia Cristã), incorporou nessa obra os conceitos do autor sobre a igreja, expressos noutros escritos.[5]
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.553)



* Os Estados Unidos da América. Nota do tradutor.
[1] Scottish Theology and Theologians, p. 95; cf. também  McPherson, The Doctrine of the Church in Scottish, p. 1 e seguintes.
[2] Preface da obra de Hodge sobre Church Polity
* Union, de Virginia. Registro aqui o seguinte pronunciamento de R. L. Dabney: “A doutrina dos sacramentos depende rigorosamente da doutrina da igreja, e é tratada por muitas autoridades como estritamente conseqüente dela (como o faz Turretino). É bom notar também que a doutrina da igreja ocupa lugar importante na teologia da redenção, podendo ser tratada nesta categoria, e também como fonte de normas práticas para a igreja. Mas como essa doutrina é tratada proficientemente noutro departamento deste Seminário, assumirei seus princípios fundamentais e os empregarei como fundamentos para o estudo dos sacramentos, sem invadir aquela esfera de pesquisa”. R. L. Dabney. Syllabus and Notes of the Course of Systematic and Polemic Theology, dado no Union Theological Seminary, Virginia. Nota do tradutor.
[3] Lect. On Theol., p. 726.
[4] Dogm. Theol. I, p. 10.
[5] P. 590 e seguintes.

NOMES BÍBLICOS DA IGREJA

1. NO VELHO TESTAMENTO. O Velho Testamento emprega duas palavras para designar a igreja, a saber, qahal (ou Kahal), derivada de uma raiz qal (ou kal) obsoleta, significando “chamar”; e ‘edhah, de ya’adh, “indicar” ou “encontrar-se ou reunir-se num lugar indicado”. Às vezes estas duas palavras são usadas indiscriminadamente, mas, de início, não eram estritamente sinônimas. ‘Edhah é propriamente uma reunião resultante da combinação, e, quando aplicada a Israel, denota a sociedade propriamente dita, formada pelos filhos de Israel ou por seus chefes representativos, reunidos ou não. Por outro lado, Qahal denota propriamente a reunião de fato do povo. Conseqüentemente, vemos ocasionalmente a expressão qehal ‘edhah, isto é, “assembléia da congregação”, Ex 12.6; Nm 14.5; Jr 26.17. Vê-se que, às vezes, a reunião realizada era uma reunião de representantes do povo, Dt 4.10; 18.16, comp. 5.22, 23; 1 Rs 8.1, 2, 3, 5; 2 Cr 5.2-6. ‘Edhah é, de longe, a palavra mais comum em Êxodo, Levítico, Números e Josué, mas está inteiramente ausente de Deuteronômio e raramente se vê nos livros posteriores. Qahal aparece numerosamente em Crônicas, Esdras e Neemias. Synagoge é a versão usual, quase universal, de ‘edhah na Septuaginta, e é também a versão usual de qahal no Pentateuco. Nos últimos livros da Bíblia [Velho Testamento], porém qahal é geralmente traduzida por ekklesia. Schuerer afirma que o judaísmo mais recente já indicava a distinção entre synagoge como designativo da congregação de Israel como uma realidade empírica, e ekklesia como o nome da mesma congregação considerada idealmente. Ele é seguido nisto pelo doutor Bavinck. Cremer-Koegel, porém, faz objeção a isto. Diz Hort que após o cativeiro a palavra qahal parece ter combinado as nuanças de sentido de qahal e ‘edhah; e que, conseqüentemente, “ekklesia, como o principal representante grego de qahal, naturalmente significaria para os judeus que falavam grego, tanto a congregação de Israel, como uma assembléia da congregação”.[1]

2. NO NOVO TESTAMENTO. O Novo Testamento também tem duas palavras, derivadas da Septuaginta, quais sejam, ekklesia, de ek e kaleo, “chamar”, “chamar para fora”, “convocar”, e synagoge, de syn e ago, significando “reunir-se” ou “reunir”. Synagoge é empregada exclusivamente para denotar, quer as reuniões religiosas dos judeus, quer os edifícios em que eles se reuniam para o culto público, Mt 4.23; At 13.43; Ap 2.9; 3.9. O termo ekklesia, porém, geralmente designa a igreja neotestamentária, embora nuns poucos lugares denote assembléias civis comuns, At 19.32, 39, 41. A preposição ek, de ekklesia (ekkaleo), muitas vezes é interpretada no sentido de “dentre as massas do povo comum” e indicando, em conexão com o uso escriturístico de ekklesia, que a igreja consiste dos eleitos, chamados para fora do mundo da humanidade. Contudo, esta interpretação é duvidosa, pois, originalmente, a preposição ek simplesmente denotava que os cidadãos gregos eram chamados para fora das suas casas. Agora, não seria antinatural que aquela idéia inteiramente escriturística tivesse sido introduzida na palavra, pela revelação de Deus. Mas, na verdade, não temos prova de que isso foi feito realmente. O verbo composto ekkaleo nunca é empregado desse modo, e a palavra ekklesia nunca ocorre num contexto no qual se tivesse a noção da presença daquele particular pensamento na mente do escritor. Deissmann simplesmente traduz ekklesia pela expressão “a assembléia (convocada)”, considerando Deus como aquele que a convoca. Dado que a idéia de igreja é um conceito caracterizado por muitas facetas, é natural que a palavra ekklesia, aplicada a ela, nem sempre tenha exatamente a mesma conotação. No Novo Testamento, Jesus foi o primeiro a fazer uso da palavra, e Ele a aplicou ao grupo dos que se reuniram em torno dele, Mt 16.18, reconheceram-no publicamente como seu Senhor e aceitaram os princípios do reino de Deus. Era a ekklesia do Messias, o verdadeiro Israel. Mais tarde, como resultado da expansão da igreja, a palavra adquiriu várias significações. Igrejas locais foram estabelecidas em toda parte, e eram também chamadas ekklesiai, desde que eram manifestações da igreja universal de Cristo. Eis os usos mais importantes da palavra:
a. Com muita freqüência a palavra ekklesia designa um círculo de crentes de alguma localidade definida, uma igreja local, independentemente da questão se esses crentes estão reunidos para o culto ou não. Algumas passagens apresentam a idéia de que se acham reunidos, At 5.11; 11.26; 1 Co 11.18; 14.19, 28, 35, enquanto que outras não, Rm 16.4; 1 Co 16.1; Gl 1.2; 1 Ts 2.14, etc.
b. Nalguns casos, a palavra denota o que se pode denominar ekklesia doméstica, igreja na casa de alguma pessoa. Ao que parece, nos tempos apostólicos, pessoas importantes por sua riqueza ou por outras razões separavam em seus lares um amplo cômodo para o serviço divino. Acham-se exemplos deste uso da palavra em Rm 16.23; 1 Co 16.19; Cl 4.15; Fm 2.
c. Se a interpretação de Tischendorf está certa (como hoje em dia se aceita que está), a palavra se acha pelo menos uma vez, no singular, para denotar um grupo de igrejas, a saber, as igrejas da Judéia, da Galiléia e de Samaria. A passagem em que o termo é empregado desse modo é At 9.31. Naturalmente, isto ainda não significa que elas constituíam uma organização como a que atualmente chamamos denominação. Não é impossível que a igreja de Jerusalém e a de Antioquia da Síria também abrangessem diversos grupos que habitualmente se reuniam em diferentes lugares.
d. Num sentido mais geral, a palavra serve para denotar a totalidade do corpo, no mundo inteiro, daqueles que professam exteriormente a Cristo e se organizam para fins de culto, sob a direção de oficiais para isso designados. Este sentido da palavra está um tanto no primeiro plano da Primeira Epístola aos Coríntios, 10.32; 11.22; 12.28, mas também parece que estava presente na mente de Paulo quando escreveu a Epístola aos Efésios, embora nesta carta a ênfase seja à igreja como organismo espiritual; cf. especialmente Ef 4.11-16.
e. Finalmente, em seu sentido mais compreensivo, a palavra se refere a todo o corpo de fiéis, quer no céu quer na terra, que se uniram ou se unirão a Cristo como seu Salvador. Este uso da palavra acha-se principalmente nas cartas de Paulo aos efésios e aos Colossenses, mais freqüentemente na primeira destas, Ef 1.22; 3.10, 21; 5.23-25, 27, 32; Cl 1.18, 24.
Devemos ter em mente que os nomes em inglês, holandês e alemão, “Church”, “Kerk” e “Kirche”, não são derivados da palavra ekklesia, mas da palavra kyriake, que significa “pertencente ao Senhor”. Eles salientam o fato de que a igreja é propriedade de Deus. O nome to kyriakon ou he kyriake designava acima de tudo o lugar onde a igreja se reunia. Entendia-se que este lugar pertencia ao Senhor e, portanto, era chamado to kyriakon. Mas o primeiro lugar propriamente dito era vazio e não se manifestava realmente como to kyriakon enquanto a igreja não se reunia ali para o culto. Conseqüentemente, a palavra foi transferida para a igreja mesma, o edifício espiritual de Deus.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.556)


[1] The Christian Ekklesia, p. 7.

OUTROS DESIGNATIVOS BÍBLICOS DA IGREJA

O Novo Testamento contém vários designativos figurados da igreja, cada qual ressaltando algum aspecto particular da igreja. Esta é chamada:
a. Corpo de Cristo. Em nossos dias, alguns parecem considerar este apelativo como uma definição completa da igreja do Novo testamento, mas não era este o propósito do seu uso. O nome não é aplicado somente à igreja universal, como em Ef 1.23; Cl 1.18, mas também a uma congregação isolada, 1 Co 12.27. Ele dá relevo à unidade da igreja, quer local quer universal, e particularmente ao fato de que esta unidade é orgânica e de que o organismo da igreja tem relação vital com Jesus Cristo visto como gloriosa cabeça.
b. Templo do Espírito Santo ou de Deus. A igreja de Corinto é chamada “santuário de Deus”, no qual o Espírito Santo habita, 1 Co 3.16. Em ef. 2.21, 22 Paulo fala que os crentes crescem “para santuário dedicado ao Senhor” e que são edificados “para habitação de Deus no Espírito”. O nome é aplicado à igreja ideal do futuro, que é a igreja universal. E Pedro afirma que os crentes, como pedras vivas, são edificados “casa espiritual”, I Pe 2.5. O contexto mostra que ele está pensando num templo. Esta figura acentua o fato de que a igreja é santa e inviolável. A permanência do Espírito Santo nela dá-lhe um caráter exaltado.
c. A Jerusalém de cima, ou nova Jerusalém, ou Jerusalém celestial. Todas estas três formas se acham na Bíblia, Gl 4.26; Hb 11.22; Ap 21.2; cf. os versículos 9 e 10. No Velho Testamento Jerusalém é descrita como o lugar onde Deus habitava entre querubins e onde, simbolicamente, Ele tinha contato com o Seu povo. O Novo Testamento, evidentemente, considera a igreja como reprodução exata da Jerusalém veterotestamentária e, daí, dá-lhe o mesmo nome. De acordo com esta descrição, a igreja é o lugar de habitação, embora ainda parcialmente na terra, pertence à esfera celestial.
d. Coluna e baluarte da verdade. Há apenas um lugar em que o nome é aplicado à igreja, a saber, 1 Tm 3.15. Refere-se à igreja em geral, e, portanto, aplica-se a cada parte dela. A figura expressa o fato de que a igreja é guardiã da verdade, cidadela da verdade e defensora da verdade contra os inimigos do reino de Deus.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.557)

A DOUTRINA DA IGREJA ANTES DA REFORMA

a. No período patrístico. Pelos chamados pais apostólicos e pelos apologetas a igreja é geralmente apresentada como a communio sanctorum, o povo de Deus que Ele escolheu por possessão. Não se viu logo a necessidade de fazer distinções. Mas já na segunda parte do século houve uma mudança perceptível. O surgimento de heresias tornou imperativa a enumeração de algumas características pelas quais se conhecesse a verdadeira igreja católica. Isso teve a tendência de fixar a atenção na manifestação externa da igreja. Começou-se a conceber a igreja como uma instituição externa, governada por um bispo como sucessor direto dos apóstolos e possuidor da tradição verdadeira. A catolicidade da igreja recebeu forte ênfase. As igrejas locais não eram consideradas como unidades separadas, mas simplesmente como partes componentes da igreja universal uma e única. O mundanismo e a corrupção crescentes na igreja foram levando aos poucos a uma reação e deram surgimento à tendência em várias seitas, como o montanismo em meados do segundo século, o novacianismo nos meados do terceiro e o donatismo no início do quarto, de fazer da santidade dos seus membros a marca da igreja verdadeira. Os pais primitivos da igreja assim chamados, ao combaterem esses sectários, davam ênfase cada vez maior à instituição episcopal da igreja. Cabe a Cipriano a distinção de ser o primeiro a desenvolver plenamente a doutrina da igreja em sua estrutura episcopal. Ele considerava os bispos como reais sucessores dos apóstolos e lhes atribuía caráter sacerdotal em virtude da sua obra sacrificial. Juntos os bispos formavam um colégio, chamado episcopado, que, como tal, constituía a unidade da igreja. Assim, a unidade da igreja baseada na unidade dos bispos. Os que não se sujeitavam os bispo perdiam o direito à comunhão da igreja e também a salvação, desde que não há salvação fora da igreja. Agostinho não foi totalmente coerente em sua concepção da igreja. Foi sua luta com os donatistas que o compeliu a refletir mais profundamente sobre a natureza da igreja. De um lado, ele se mostra o predestinacionista que concebe a igreja como a companhia dos eleitos, a communio sanctorum, que têm o Espírito de Deus, e, portanto, são caracterizados pelo amor verdadeiro. O importante é ser membro vivo da igreja assim concebida, e não apenas pertencer a ela num sentido meramente externo. Mas de outro lado, ele é o homem de igreja, que adere à idéia da igreja defendida por Cipriano, ao menos em seus aspectos gerais. A igreja verdadeira é a igreja católica, na qual a autoridade apostólica tem continuidade mediante a sucessão episcopal. É depositária da graça divina, que ela distribui por meio dos sacramentos. Esta igreja é, de fato, um corpo misto, no qual têm lugar membros bons e maus. Em seu debate com os donatistas, porém, Agostinho admitia que aqueles e estes não estavam na igreja no mesmo sentido. Ele preparou também o caminho para a identificação católica romana da igreja com o reino de Deus.
b. Na Idade Média. Os escolásticos não tinham muito que dizer acerca da igreja. O sistema de doutrina desenvolvido por Cipriano e Agostinho estava completo, e precisava apenas de uns pequenos retoques de acabamento para chegar ao seu desenvolvimento final. Diz Otten (historiador católico romano): “Este sistema foi recebido pelos escolásticos da Idade Média e depois foi passado por eles, praticamente nas mesmas condições em que o tinham recebido, aos seus sucessores de após o Concílio de Trento”.[1] Incidentalmente, uns poucos pontos mais foram desenvolvidos de algum modo. Mas, se houve pequeno desenvolvimento da doutrina da igreja propriamente dita,a igreja mesma realmente se desenvolveu mais e mais, rumo a uma hierarquia hermética e compactamente organizada e absoluta. As sementes deste desenvolvimento já estavam na idéia da igreja apregoada por Cipriano e num aspecto da igreja como descrita por Agostinho. A outra idéia,e mais fundamental, daquele grande “pai da igreja”, a da igreja como communio sanctorum, em geral foi desconsiderada e, assim, ficou adormecida. Isto não quer dizer que os escolásticos negavam completamente o elemento espiritual, mas simplesmente que não lhe davam a devida proeminência. A ênfase era mui definidamente à igreja como uma organização ou instituição externa. Hugo de S. Victor fala da igreja e do estado como os dois poderes instituídos por Deus para governarem o povo. Ambos são de constituição monárquica, mas a igreja é o poder superior, porque ministra a salvação dos homens, ao passo que o Estado só providencia o seu bem-estar temporal. O rei ou imperador é o chefe do estado, mas o papa é o chefe da igreja. Há duas classes de pessoas na igreja, com direitos e deveres bem definidos; os clérigos, dedicados ao serviço de Deus, que constituem uma unidade; e os leigos, que consistem as pessoas de todas as esferas da vida e que constituem uma classe totalmente separada. Passo a passo a doutrina do pecado foi-se desenvolvendo, até que, por fim, o papa se tornou virtualmente um monarca absoluto. O crescimento desta doutrina foi auxiliado, em não pequena medida, pelo desenvolvimento da idéia de que a igreja católica era o reino de Deus na terra, e, portanto, o bispado romano era um reino terreno. Esta identificação da igreja visível e organizada com o reino de Deus teve conseqüência de longo alcance: (1) Exigia que tudo fosse colocado debaixo do poder da igreja: o lar e a escola, as ciências e as artes, o comércio e a indústria, e tudo mais. (2) Envolvia a idéia de que todas as bênçãos da salvação chegam ao homem unicamente por meio das ordenanças da igreja, em particular, mediante sacramentos. (3) Levou à gradual secularização da igreja, visto que esta começou a dar mais atenção à política do que à salvação dos pecadores e, finalmente, os papas reivindicaram domínio sobre os governantes seculares também.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.559)


[1] Manual of the History of Dogmas II, p. 214.

A DOUTRINA DA IGREJA DURANTE E APÓS A REFORMA

a. Durante o período da Reforma. Os Reformadores romperam com a concepção católica romana da igreja, mas tiveram diferenças entre si nalgumas particularidades. A idéia de uma igreja infalível e hierárquica, e de um sacerdócio especial, que dispensa a salvação por intermédio dos sacramentos, não teve o apoio de Lutero. Ele considerava a igreja como a comunhão espiritual daqueles que crêem em Cristo, e restabeleceu a idéia escriturística do sacerdócio de todos os crentes. Ele defendia a unidade da igreja, mas distinguia dois aspectos dela, um visível e outro invisível. Ele teve o cuidado de assinalar que não existem duas igrejas, mas simplesmente dois aspectos da mesma igreja. A igreja invisível torna-se visível, não pelo governo de bispos e cardeais, nem na chefia do papa, mas pela administração da Palavra e dos sacramentos. Lutero admitia que a igreja visível sempre conterá uma mistura e membros fiéis e ímpios. Contudo, em sua reação contra a idéia católica romana do domínio da igreja sobre o estado, ele foi ao outro extremo e virtualmente sujeitou a igreja ao estado em tudo, menos na pregação da Palavra. Os anabatistas não ficaram satisfeitos com a posição de Lutero e insistiam numa igreja só de crentes. Em muitos casos, eles zombavam da igreja visível e dos meios de graça. Além disso, exigiam completa separação de igreja e estado. Calvino e os teólogos reformados estavam de acordo com Lutero quanto à confissão de que a igreja é essencialmente uma communio sanctorum, uma comunhão de santos. Todavia, eles não procuravam, como os luteranos, a unidade e a santidade da igreja primariamente nas ordenanças objetivas da igreja, tais como os ofícios, a Palavra e os sacramentos, mas sobretudo na comunhão subjetiva dos crentes. Distinguiam, também, entre um aspecto visível e um aspecto invisível da igreja, embora de maneira ligeiramente diversa. Ademais, encontravam as verdadeiras marcas da igreja, não somente na correta administração da Palavra e dos Sacramentos, mas também na fiel administração da disciplina da igreja. Mas, até mesmo Calvino e os teólogos reformados do século dezessete fomentaram, em certa medida, a idéia de sujeição da igreja ao estado. Contudo, estabeleceram uma forma de governo da igreja que propiciava maior grau de independência e poder eclesiásticos que o que se conhecia na igreja luterana. Mas, enquanto que tanto os teólogos luteranos como os reformados (calvinistas) procuravam manter a relação apropriada entre a igreja visível e a invisível, outros perderam isto de vista. Os socinianos e os arminianos do século dezessete, embora na verdade falassem de uma igreja invisível, esqueceram tudo que diz respeito à vida real. Os primeiros concebiam a religião cristã simplesmente como uma doutrina aceitável, e os últimos faziam da igreja primariamente uma sociedade visível e seguiam a igreja luterana no sentido de entregarem ao estado o direito de ministrar a disciplina, e de reterem para a igreja somente o direito de pregar o Evangelho e admoestar os membros da Igreja. Por outro lado, os labadistas e os pietistas manifestaram a tendência de desconsiderar a igreja visível, procurando uma igreja só de crentes, mostrando-se indiferentes para com a igreja institucional com sua mescla de bons e maus, e buscando edificação nos conventículos.
b. Durante e após o século dezoito. Durante o século dezoito o racionalismo também fez sentir sua influência sobre a doutrina da igreja. Era indiferente em matéria de fé e não tinha entusiasmo pela igreja, que ele colocou a par com outras sociedades humanas.até negava que Cristo tivesse a intenção de fundar uma igreja no sentido geralmente aceito da palavra. Houve uma reação pietista ao racionalismo no metodismo, mas o metodismo em nada contribuiu para o desenvolvimento da doutrina da igreja. Nalguns casos, ele procurou força na repreensão lançada às igrejas existentes, e noutros, adaptou-se à vida destas igrejas. Para Schleiermacher, a igreja era essencialmente a comunidade cristã, o corpo dos crentes animados pelo mesmo espírito. Ele via pouca utilidade na distinção entre a igreja visível e a invisível, e via a essência da igreja no espírito de companheirismo cristão. Quanto mais o Espírito de Deus penetrar a totalidade dos crentes cristãos, menos divisões haverá, e mais perderão elas a sua importância. Ritschl substituiu a distinção entre a igreja invisível e a visível pela distinção entre o reino e a igreja. Ele considerava o reino como a comunidade do povo de Deus que age motivado pelo amor, e a igreja como aquela mesma comunidade reunida para o culto. O nome “igreja” restringe-se, pois, a uma organização externa com a função única de cultuar; e esta função apenas capacita os crentes a familiarizar-se melhor uns com os outros. Isto certamente está longe do ensino do Novo Testamento. Leva diretamente à concepção “liberal” moderna da igreja como um mero centro social, uma instituição humana, e não uma lavoura de Deus.
QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. A história da igreja começa no dia de Pentecostes, ou antes? 2. Se começa antes, como a igreja anterior àquela difere da que se lhe segue? 3. A qual igreja Jesus se refere em Mt 18.17? 4. Agostinho identificou a igreja como organismo espiritual ou como instituição externa, com o reino de Deus? 5. Como explicar a ênfase católica romana à igreja como organização externa? 6. Por que os Reformadores não insistiram na total liberdade da igreja quanto ao estado? 7. Como diferiam Lutero e Calvino com respeito a isto? 8. Que controvérsias acerca da igreja surgiram na Escócia? 9. Que explica as diferentes concepções da igreja na Inglaterra e na Escócia? 10. Como foi que o racionalismo afetou a doutrina da igreja? 11. Que grandes perigos estão ameaçando a igreja na época atual?
BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. IV, p. 302-319; Innes, Church and State; Cunningham, Historical Theology, dois volumes, cf. o Índice; Hauck, Real-Encyclopaedie, Art. Kirche, de Koestlin of Dogma, principalmente as de Harnak, Seeberg, Sheldon e Otten, cf. Índices.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.561)

quarta-feira, 20 de março de 2013

NATUREZA DA IGREJA

A. A Essência da Igreja.

1. A CONCEPÇÃO CATÓLICA ROMANA. Os cristãos primitivos falavam da igreja como a communio sanctorum e assim, sem contudo terem pensado na matéria completamente, já deram expressão à essência da igreja. Logo, porém, no fim do segundo século, como resultado do surgimento de heresias, a questão quanto à verdadeira igreja se lhes impôs e os levou a fixar a atenção em certas características da igreja como instituição externa. Desde o tempo de Cipriano até a Reforma, a essência da igreja foi cada vez mais procurada em sua organização visível e externa. Os chamados pais da igreja entendiam que a igreja compreende todos os ramos da igreja de Cristo e que é entrelaçada numa unidade externa e visível, tendo seu laço unificador no colégio de bispos. A concepção da igreja como organização externa com o tempo foi ganhando proeminência. Foi dada crescente ênfase à sua organização hierárquica, e nesta foi posto o selo definitivo com a instituição do papado. Os católicos romanos definem a igreja como: “A congregação de todos os fiéis que, sendo batizados, professam a mesma fé, participam dos mesmos sacramentos e são governados por seus legítimos pastores, sob um chefe visível na terra”. Eles fazem distinção entre a ecclesia docens e a ecclesia audiens (igreja docente e ouvinte), isto é, entre “a igreja que consiste dos que governam, ensinam e edificam” e “a igreja que é ensinada e governada, e que recebe os sacramentos”. No sentido estrito da palavra, não é a ecclesia audiens que constitui a igreja, mas, sim, a ecclesia docens. Esta participa diretamente dos gloriosos atributos da igreja, mas aquela só indiretamente é adornada por eles. Os católicos romanos estão prontos a admitir que há um lado invisível da igreja, mas preferem reservar o nome “igreja” para a comunhão visível dos crentes. Falam eles com freqüência da “alma da igreja”, mas não parecem estar em pleno acordo quanto à conotação exata do termo. Devine define a alma da igreja como a “sociedade daqueles que são chamados para a fé em Cristo e que são unidos a Cristo por dons e graças sobrenaturais”.[1] Wilmers, porém, a vê “naquelas graças espirituais e sobrenaturais que constituem a igreja de Cristo e habilitam os seus membros a alcançarem o seu fim último”. Diz ele: “O que denominamos alma em geral é aquele princípio impregnante que dá vida a um corpo e capacita os seus membros a exercerem funções peculiares. À alma da igreja pertencem a fé, a comum aspiração de todos pelo mesmo fim, a invisível autoridade dos superiores, a graça interior da santificação, as virtudes sobrenaturais e outros dons da graça”.[2] O primeiro escritor supracitado vê a alma da igreja em certas pessoas qualificadas, enquanto que o segundo a considera como um princípio totalmente impregnante, algo semelhante à alma do homem. Mas, seja o que for que os católicos romanos estejam prontos a admitir, eles não admitem que aquilo que se pode denominar “igreja invisível” preceda logicamente à visível. Diz Moehler: “Os católicos (romanos) ensinam: primeiro vem a igreja visível – depois a invisível: a primeira dá nascimento à segunda”. Quer dizer que a igreja é a mater fidelium (mãe dos crentes) antes de ser uma communio fidelium (comunidade de crentes). Contudo, Moehler concede que há um sentido em que a “igreja interna” antecede à “igreja externa”, a saber, no sentido de que não somos membros vivos desta enquanto não pertencermos àquela. Ele discute todo o assunto da relação mútua das duas em sua obra. Symbolism or Doctrinal Differences (Simbolismo ou Diferenças Doutrinárias).[3] Salienta ele a identidade da igreja visível com Cristo: “Assim, do ponto de vista aqui tomado, a igreja visível é o Filho de Deus perenemente se manifestando entre os homens em forma humana, perpetuamente renovada e eternamente jovem – a permanente encarnação dele, como na Escritura Sagrada, pelo que os fiéis são chamados ‘corpo de Cristo’”.[4]
2. A CONCEPÇÃO ORTODOXA GREGA. A concepção ortodoxa grega da igreja é estreitamente relacionada com a dos católicos romanos, e, todavia, difere dela nalguns pontos importantes. Essa igreja não reconhece a Igreja Católica Romana como a igreja verdadeira, mas reivindica para si esta honra. Há somente uma igreja verdadeira, e essa igreja é a Ortodoxa Grega. Conquanto reconheça com maior franqueza do que os católicos romanos os dois diferentes aspectos da igreja, visível e invisível, não obstante coloca a ênfase na igreja como organização. Ela vê a essência da igreja em seu caráter de comunidade dos santos, mas na hierarquia episcopal, que ela conservou, apesar de rejeitar o papado. A infalibilidade da igreja é defendida, mas esta infalibilidade reside nos bispos, e, portanto, nos concílios e sínodos eclesiásticos. “Como invisível”, diz Gavin, “ela (a igreja) é portadora de dons e poderes divinos e está empenhada em transformar a humanidade no reino de Deus. Como visível, ela é constituída de homens que professam uma fé comum, observam costumes comuns e usam meios de graça visíveis”. Ao mesmo tempo, é rejeitada a idéia de “uma igreja invisível e ideal, da qual os vários corpos de cristãos, formando organizações distintas e se chamando ‘igrejas’, são incorporações parciais e incompletas”. A igreja é “uma entidade concreta, tangível e visível, não um ideal não realizado e irrealizável”.[5]
3. A CONCEPÇÃO PROTESTANTE. A Reforma foi uma reação contra o externalismo de Roma em Geral, e em particular, também contra a sua concepção externa da igreja. Ela tornou a trazer ao primeiro plano a verdade de que a essência da igreja não se acha na organização externa da igreja, mas nesta como a communio sanctorum. Tanto para Lutero como para Calvino, a igreja era simplesmente a comunidade dos santos, isto é, a comunidade dos que crêem e são santificados em Cristo, e que estão ligados a Ele, sendo Ele a sua Cabeça. Esta é também a posição exposta nos padrões confessionais reformados (calvinistas). Daí, diz a Confissão Belga: “Cremos e professamos uma só igreja católica ou universal, que é uma santa congregação de verdadeiros crentes cristãos, todos esperando a sua salvação em Jesus Cristo, sendo lavados por Seu sangue, santificados e selados pelo Espírito Santo”.[6] A Segunda Confissão Helvética expressa a mesma verdade, dizendo que a igreja é “uma assembléia dos fiéis, convocada e reunida do mundo, uma comunhão de todos os santos, isto é, daqueles que verdadeiramente conhecem e retamente adoram e servem o verdadeiro Deus em Jesus Cristo, o Salvador, pela palavra do Espírito Santo, e que pela fé participam de todos os benefícios gratuitamente oferecidos mediante Cristo”.[7] E a Confissão de Westminster, definindo a igreja do ponto de vista da eleição, diz: “A igreja católica ou universal, que é invisível, consta do numero total dos eleitos que já forma, dos que agora são e dos que ainda serão reunidos em um só corpo sob Cristo, sua cabeça; ela é a esposa, o corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todas as coisas”.[8] A igreja universal, sito é, a igreja como existe no plano de Deus e só se concretiza no transcurso dos séculos, foi entendida no sentido de que consiste do corpo completo dos eleitos, os quais, no transcorrer do tempo, são chamados para a vida eterna. Mas a igreja, como existe realmente na terra, foi considerada como a comunidade dos santos. E não é somente a igreja invisível que foi entendida assim, mas a igreja visível também. Estas não são duas igrejas, mas uma somente e, portanto, têm apenas uma única essência. Uma, bem como a outra, é essencialmente a communio sanctorum, mas a igreja invisível é a igreja como Deus a vê, uma igreja que só contém crentes, ao passo que a igreja visível é a igreja como o homem a vê, composta dos que professam a Jesus Cristo, juntamente com seus filhos e, portanto, julgados como sendo a comunidade dos santos. Esta pode conter, e sempre contém de fato, alguns que ainda não foram regenerados – pode haver joio entre o trigo – porém não pode tolerar incrédulos declarados e pessoas ímpias. Paulo dirige as suas epístolas a igrejas empíricas, e não hesita em tratar os seus membros de “santos”, mas também insiste na necessidade de expulsar os ímpios e os que, praticam delitos, 1 Co 5; 2 Ts 3.6, 14; Tt 3.10. A igreja forma uma unidade espiritual da qual Cristo é o Chefe divino. É animada por um Espírito, o Espírito de Cristo; professa uma fé, comparte uma esperança e serve a um só Rei. É a cidadela da verdade e a agência de Deus para comunicar aos crentes todas as bênçãos espirituais. Como corpo de Cristo, está destinada a refletir a glória de Deus como esta se vê manifestada na obra de redenção. A igreja, em seu sentido ideal, a igreja como Deus quer que ela seja e como um dia virá a ser, é mais objeto de fé que de conhecimento. Daí a confissão: “Creio na santa igreja católica”.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.564)


[1] The Creed Explained, p. 259.
[2] Handbook of the Christian Religion, p. 103.
[3] Cap. V, principalmente nos parágrafos XLVI-XLVIII.
[4] P. 59
[5] Greek Orthodox Thought, p. 241, 242.
[6] Art. XXVII.
[7] Cap. XVII.
[8] Cap. XXV.

A DA IGREJA MILITANTE E A IGREJA TRIUNFANTE

 Na presente dispensação, a igreja é militante, isto é, convocada para uma guerra santa, e de fato nela está emprenhada. Isto, naturalmente, não significa que ela deve gastar suas forças em lutas sangrentas de autodestruição, mas, sim, que tem o dever de levar avante uma incessante guerra contra o mundo hostil em todas as formas em que este se revele, seja na igreja ou fora dela, e contra todos os poderes espirituais das trevas. A igreja não pode passar o tempo todo em oração e meditação, embora estas práticas sejam tão necessárias e importantes, nem tampouco deve parar de agir, no pacífico gozo da sua herança espiritual. Ela tem que estar engajada com todas as suas forças nas pelejas do seu Senhor, combatendo numa guerra que é tanto ofensiva como defensiva. Se a igreja na terra é a igreja militante, no céu é a igreja triunfante. Lá a espada é permutada pelos louros da vitória, os brados de guerra se transformam em cânticos triunfais, e a cruz é substituída pela coroa. A luta é finda, a batalha está ganha, e os santos reinam com Cristo para todo o sempre. Nestes dois estágios da sua existência, a igreja reflete a humilhação e a exaltação do seu celestial Senhor. Os católicos romanos falam, não somente de uma igreja militante e triunfante, mas também de uma igreja padecente. Esta igreja, de acordo com eles, inclui todos os crentes que já não estão na terra, mas que ainda não penetraram nos gozos do céu, e agora estão sendo purificados dos seus restantes pecados no purgatório.
(Berkhof, L – Teologia Sistemática Pg.564)