1.
ANTES DA REFORMA. Os chamados “pais primitivos” consideravam o batismo como o
rito de iniciação na igreja, e normalmente o consideravam como estreitamente
ligado ao perdão de pecados e à comunicação da nova vida. Algumas das suas
expressões parecem indicar que eles criam na regeneração batismal. Ao mesmo
tempo, deve-se notar que, no caso dos adultos, eles não consideram o batismo
como eficaz independentemente da correta disposição da alma, e não viam o
batismo como absolutamente essencial para a iniciação da nova vida, mas, antes,
consideravam-no como o elemento de consumação do processo de renovação. O
batismo de crianças já era corrente nos dias de Orígenes e Tertuliano, embora
este último o desestimulasse, com base em questões de conveniência.
A opinião geral era que o batismo nunca devia ser
repetido, mas não havia unanimidade quanto à validade do batismo ministrado por
hereges. No transcorrer do tempo, porém, veio a ser um princípio estabelecido
não rebatizar os que foram batizados em nome do Deus triúno. O modo do batismo
não estava em discussão.
Do segundo século em diante, aos poucos ganhou terreno a
idéia de que o batismo age mais ou menos magicamente. Até mesmo Agostinho
parece ter considerado o batismo como eficiente ex opere operato, no
caso das crianças. Ele considerava absolutamente necessário o batismo e
afirmava que as crianças não batizadas estão perdidas. Segundo ele, o batismo
elimina a culpa original, mas não remove totalmente a corrupção da natureza. Os
escolásticos a princípio partilhavam o conceito de Agostinho, que, no caso do
batismo de adultos, que o batismo é sempre eficaz ex opere operato. A
importância das condições subjetivas foi menosprezada. Assim, a característica
concepção católica romana do sacramento, de acordo com a qual o batismo é o
sacramento da regeneração e da iniciação na igreja, aos poucos ganhou
proeminência. Ele contém a graça que simboliza e a confere a todos quantos não
ponham obstáculo no caminho. Esta graça era considerada muito importante, visto
que (a) marca indelevelmente o participante como membro da igreja; (b) livra da
culpa do pecado original e de todos os pecados atuais cometidos até à hora do
batismo, remove a corrupção do pecado, embora permaneça a concupiscência, e
liberta o homem da punição eterna e de todas as punições temporais positivas;
(c) produz renovação espiritual pela infusão da graça santificante e das
virtudes sobrenaturais da fé, da esperança e do amor; e (d) incorpora o
participante na comunhão dos santos e na igreja visível.
2.
DESDE A REFORMA. A Reforma Luterana não se desfez inteiramente da concepção
católica romana dos sacramentos. Para Lutero, a água do batismo não é água
comum, mas uma água que, mediante a Palavra com seu poder divino inerente, veio
a ser uma água da vida, cheia de graça, um lavamento de regeneração. Por esta
eficácia divina da Palavra, o sacramento efetua a regeneração. No caso dos
adultos, Lutero colocava o efeito do batismo na dependência da fé presente no
participante. Percebendo que não podia pensar desse modo no caso de crianças,
que não podem exercer fé, ele, certa vez, afirmou que Deus, por Sua graça
preveniente, produz fé na criança ainda sem discernimento, mas posteriormente
confessou ignorância sobre este ponto. Teólogos luteranos mais recentes houve
que retiveram a idéia de uma fé infantil como pré-condição para o batismo, ao
passo que outros entendiam que o batismo produz essa fé imediatamente. Nalguns
casos, isto levou à idéia de que o sacramento age ex opere operato.
Os anabatistas cortaram o nó górdio de Lutero negando a
legitimidade do batismo de crianças. Eles insistiam em batizar todos os
candidatos à admissão no seu círculo que tinham recebido o sacramento na
infância, e não consideravam isto um rebatismo, mas, sim, o primeiro batismo
verdadeiro. Para eles, as crianças não têm lugar nenhum na igreja.
Calvino e a teologia reformada partiam da pressuposição
de que o batismo foi instituído para os crentes, e não produz, mas fortalece a
nova vida. Naturalmente, eles se defrontaram com a questão como as crianças
poderiam ser consideradas crentes e sobre como poderiam ser fortalecidas
espiritualmente, visto não poderem exercer fé. Alguns simplesmente assinalavam
que as crianças nascidas de pais crentes são filhos da aliança e, como tais,
herdeiros das promessas de Deus, incluindo-se também a promessa de regeneração;
e que a eficácia espiritual do batismo não se limita à hora da sua ministração,
mas continua durante a vida toda. A Confissão Belga também expressa essa idéia
com as seguintes palavras: “Tampouco este batismo nos é útil somente na ocasião
em que a água é derramada sobre nós e recebida por nós, mas também no
transcurso de toda a nossa vida”.[1]
Outros foram além dessa posição e afirmavam que os filhos da aliança devem ser
considerados presumivelmente regenerados. Isto não equivale a dizer que
todos eles são regenerados quando são apresentados para o batismo, mas que se
presume que são regenerados, enquanto não se deduza das suas vidas o contrário.
Havia ainda alguns que consideravam o batismo como nada mais que o sinal de uma
aliança externa. Sob a influencia dos socinianos, dos arminianos, dos
anabatistas e dos racionalistas, tornou-se costume em muitos círculos negar que
o batismo seja um selo da graça divina, e considera-lo como um simples ato de
profissão da parte do homem. Em nossos dias, muitos cristãos professos perderam
completamente a consciência da significação espiritual do batismo. Tornou-se
mera formalidade.
(Berkhof,
L. – Teologia Sistemática Pg630)