(1) Posição dos nossos padrões confessionais. A Confissão
Belga declara no Art. XXXIV que os filhos pequenos de pais crentes “devem
ser batizados e selados com o sinal da aliança, como anteriormente as crianças
de Israel eram circuncidadas com base nas mesmas promessas feitas às nossas
crianças”. O Catecismo de Heidelberg responde a pergunta, “As crianças
também devem ser batizadas?”, como segue: “Sim, pois, desde que elas estão,
como os adultos, incluídas na aliança e na igreja de Deus, e desde que tanto a
redenção do pecado como o Espírito, o Autor da fé, lhes são prometidos não
menos que aos adultos, mediante o sangue de Cristo, elas também devem, pelo
batismo, como sinal da aliança, ser enxertadas na igreja cristã, e devem ser
distinguidas dos filhos dos descrentes, como se fazia na antiga dispensação ou
testamento pela circuncisão, em lugar da qual o batismo foi instituído na nova
aliança”.[1]
E os Cânones de Dort contêm a seguinte declaração em I, Art. 17: “Uma
vez que devemos discernir a vontade de Deus em Sua Palavra , que
atesta que os filhos dos crentes são santos, não por natureza, mas em virtude
da aliança da graça, que os abrange juntamente com seus pais, os pais crentes
não devem duvidar da eleição e salvação dos seus filhos, a quem praza a Deus
chamar desta vida em sua infância (Gn 17.7; At 2.39; 1 Co 7.14)”. estas
declarações dos nossos padrões confessionais estão em plena harmonia com a
posição de Calvino, segundo a qual, os filhos pequenos de pais crentes, ou
aqueles que têm somente um dos pais crentes, são batizados com base em sua
relação pactual.[2] A nossa Forma
para o Batismo de Crianças (Form for the Baptism of Infants) toca na mesma
tecla: “Então, desde que o batismo tomou o lugar da circuncisão, as crianças
devem ser batizadas como herdeiras do reino de Deus e da Sua aliança”.
Observe-se que todas essas declarações se baseiam no mandamento de Deus que
manda circuncidar os filhos da aliança, pois, em última análise, o mandamento é
a base do batismo de crianças.*
Com fundamento em nossos padrões confessionais, pode-se
dizer que os filhos pequenos de pais crentes são batizados com base em que são
filhos da aliança e, como tais, são herdeiros das amplíssimas promessas
pactuais de Deus, que incluem também a promessa de perdão dos pecados e da
dádiva do Espírito Santo para a regeneração e a santificação. Na aliança Deus
lhes dá certa concessão ou dádiva de maneira formal e objetiva, exige deles
que, no devido tempo, aceitem isto pela fé, e promete fazer disso uma vívida
realidade nas vidas deles, pela operação do Espírito Santo. E, em vista deste
fato, a igreja deve considera-los como herdeiros prospectivos da salvação, deve
considera-los como estando na obrigação de andar nas veredas da aliança, tem o
direito de esperar que, sob uma fiel administração pactual, eles, falando em
termos gerais, vivam segundo a aliança, e é seu dever considera-los como
infratores da aliança, se não cumprirem as exigências desta. É unicamente deste
modo que se faz plena justiça às promessas de Deus, que em toda a sua plenitude
deverão ser assimiladas pela fé por aqueles que chegarem à maturidade. Assim, a
aliança, incluindo as promessas pactuais, constitui a base legal e objetiva do
batismo de crianças. O batismo é sinal e selo de tudo quanto as promessas
abrangem.
(2) Diferenças de opinião entre os teólogos
reformados (calvinistas). Nem todos os teólogos reformados concordavam no
passado, e mesmo agora não são todos unânimes em sua apresentação da base do
batismo de crianças. Muitos teólogos dos séculos dezesseis e dezessete
assumiram a posição descrita no item anterior, a saber, que os filhos pequenos
dos crentes são batizados porque estão na aliança e, nesta qualidade, são
herdeiros das ricas promessas de Deus, que incluem o direito, não somente à
regeneração, mas também a todas as bênçãos da justificação e das influências
renovadoras e santificantes do Espírito Santo. Outros, porém, embora
reconhecendo a veracidade dessa apresentação, não se satisfaziam inteiramente
com ela. Acentuavam o fato de que o batismo é algo mais que sinal e selo de uma
promessa, ou mesmo de todas as promessas da aliança, e que não é apenas o selo
de um bem futuro, mas também de posses espirituais no presente. Prevaleceu o
conceito de que o batismo é ministrado a crianças com base na regeneração
presuntiva. Mas mesmo entre os que esposavam este conceito não havia pelo
acordo. Alguns combinavam esta idéia com outra, enquanto outros substituíam
aquela por esta. Alguns partiam do pressuposto de que todas as crianças
apresentadas para o batismo são regeneradas, ao passo que outros só admitiam
isto em conexão com as crianças eleitas. A diferença de opiniões entre os que
criam que os filhos dos crentes são batizados com base em seu relacionamento
pactual e na promessa da aliança, e os que viam esta base na regeneração
presuntiva persistiu até os dias atuais e foi causa de vigorosa controvérsia,
principalmente na Holanda, durante o último período do século dezenove e o
princípio do século vinte.
A princípio, o doutor Kuyper falava da regeneração
presuntiva como a base do batismo de crianças, e muitos aceitaram prontamente
essa idéia. G. Kramer escreve sua esplêndida tese sobre Het Verband van Doop
em Wedergeboorte especialmente em defesa dessa posição. Posteriormente, o
doutro Kuyper deixou de usar de vez essa expressão, e alguns dos seus
seguidores sentiram necessidade de uma discriminação mais cuidadosa e falavam
da relação pactual como base legal do batismo de crianças, e da regeneração
presuntiva como sua base espiritual. Mas, até mesmo esta ainda não é uma
posição satisfatória. O doutor Honig, que também é um discípulo e admirador de
Kuyper, está na pista certa quando diz, em seu recente*
Manual de Dogmática Reformada (Handboek van de Gereformeerde Dogmatiek):[3]
“Não batizamos os filhos pequenos dos crentes baseados numa pressuposição, mas
numa ordem e num ato de Deus. As crianças devem ser batizadas em virtude da
aliança de Deus” (versão inglesa de Berkof, do original holandês). A
regeneração presuntiva naturalmente não pode ser considerada como a base legal
do pedobatismo; esta só pode ser encontrada na promessa pactual de Deus. Além
disso, ela não pode ser considerada a base em nenhum sentido da palavra, desde
que o batismo tem que ser algo objetivo, como os próprios defensores do
conceito em foco e sentem constrangidos a admitir. Se lhes perguntam por que
presumem a regeneração das crianças apresentadas para o batismo, eles só podem
responder: “Porque elas nasceram de pais crentes, isto é, porque nasceram na
aliança”. Naturalmente, negar que a regeneração presuntiva é a base do batismo
de crianças não equivale a dizer que é inteiramente destituído de base presumir
que as crianças nascidas de pais crentes são regeneradas. Esta é uma questão
que deve ser considerada com base em seus próprios méritos.
Talvez seja bom citar neste contexto a primeira metade
do quarto ponto das Conclusões de Ultrecht, adotadas por nossa igreja em
1908. Traduzimo-la da seguinte maneira: “E finalmente, no que concerne ao
quarto ponto, o da regeneração presuntiva, o Sínodo declara que, de
acordo com a confissão das nossas igrejas, deve-se presumir que a semente da
aliança, em virtude da promessa de Deus, é regenerada e santificada em Cristo,
enquanto o contrário não aparecer em sua vida ou doutrina, quando crescer; que,
todavia, é menos correto dizer que o batismo é ministrado aos filhos pequenos
dos crentes com base em sua regeneração presuntiva, visto que a base do batismo
é a ordem e a promessa de Deus; e que, ademais, o juízo de amor como qual a
igreja presume que a semente da aliança é regenerada, de modo nenhum tenciona
dizer que, portanto, cada criança é realmente regenerada, desde que a Palavra
de Deus ensina que nem todos os de Israel são de fato israelitas, e de Isaque
se diz: Nele será chamada a tua semente – ou descendência (Rm 9.6, 7), de modo
que na pregação é sempre necessário insistir no sério exame próprio uma vez que
somente os que crêem e são batizados serão salvos”.[4]
(3) Objeção à idéia de que as crianças são batizadas
com base em sua relação pactual. Tem-se dito que, se as crianças são
batizadas com base em que elas nascem na aliança e, portanto, são herdeiras da
promessa, são batizadas com base diferente da dos adultos, visto que estes são
batizados com base em sua fé ou em sua profissão de fé. Mas isto a rigor não é
certo, como Calvino já o demonstrou em seus dias. O grande Reformador respondeu
eficientemente a esta objeção. O que vem a seguir é tradução do que Kramer diz
a respeito da posição de Calvino sobre este ponto: “Com relação ao batismo de
crianças, Calvino vê ocasião aqui, agora que ele tomou a perspectiva da
aliança, para traçar linha mais longa. Até este ponto, ele não chamou a atenção
para o fato de que os adultos também são batizados de acordo com a regra da
aliança. E, daí, poderia parecer que há uma diferença entre o batismo de
adultos e o de crianças. Os adultos seriam batizados com base em sua fé, as
crianças com base na aliança de Deus. Não, declara o Reformador, a única regra
segundo a qual, e a única base legal sobre a qual a igreja pode ministrar o
batismo, é a aliança. Isto é verdade, tanto no caso de crianças como no de
adultos. Se estes devem primeiro fazer uma confissão de fé e passar pela
conversão, é porque se acham fora da aliança. Para serem admitidos à comunhão
da aliança, devem aprender primeiro quais as exigências da aliança, e, depois,
a fé a conversão abrem caminho para a aliança.”[5]
Exatamente a mesma opinião é expressa por Bavinck..[6]
Quer dizer que, depois que os adultos adentram a aliança pela fé e conversão,
recebem o sacramento do batismo com base nessa relação pactual. Também para
eles o batismo é sinal e selo da aliança.
(Berkhof,
L. – Teologia Sistemática Pg644)
[1] Lord’s
Day XXVII. Perg. 74.
[2] Inst.
IV 16:6, 15.
* Os símbolos de fé da Igreja Presbiteriana (que são os de
Westminster) tratam do pedobatismo nas seguintes partes: Confissão de Fé,
Capítulo XXVIII, Seções IV a VI; Catecismo Maior, Perguntas 166 e 167; e
Breve Catecismo (ou Catecismo Menor), Pergunta 95. Nota do
tradutor.
* 1938. Nota do Tradutor.
[3] P. 655.
[4] Acts
of Synod, 1908, p. 82, 83.
[5] Het Verband van Doop em
Wedergeboorte, p. 122, 123.
[6] Geref.
Dogm. IV, p. 581.