(1) A circuncisão era apenas uma ordenança carnal e
típica, e, como tal, esta destinada a extinguir-se. Colocar o batismo no lugar
da circuncisão é simplesmente dar continuidade à ordenança carnal. Ordenanças
carnais que tais não têm lugar legítimo na igreja no Novo Testamento. Em nossos
dias, esta objeção é levantada por alguns dispensacionalistas, como Bullinger e
O’Hair, que alegam que o batismo instituído por Jesus está relacionado com o
Reino, e que somente o batismo do Espírito tem um lugar próprio na igreja. O
Livro de Atos marca a transição do batismo com água para o batismo com o
Espírito. Naturalmente, este argumento provaria que todo batismo, o de adultos
e o de crianças, é ilegítimo. Nesta apresentação do assunto, as dispensações
judaica e cristã são postas em antagonismo uma contra a outra, como carnal e
espiritual, dizendo-se que a circuncisão pertence à primeira delas. Mas este
argumento é falaz. Não há base para por a circuncisão inteiramente ao nível das
ordenanças carnais da lei mosaica. Diz Bannerman: “A circuncisão independia,
quer da introdução que da abolição da lei de Moisés, e teria continuado de pé
como ordenança para admissão na igreja de Deus como selo da aliança da graça,
se o batismo não tivesse sido designado expressamente como seu substituto”.[1]
Pode-se admitir que a circuncisão adquiriu certa significação típica no período
mosaico, mas era primordialmente sinal e selo da aliança já feita com Abraão.
Enquanto tipo, naturalmente cessou com o surgimento do antítipo, e mesmo como
um selo da aliança, abriu alas para um sacramento incruento expressamente
instituído por Cristo para a igreja e reconhecido como tal pelos apóstolos,
visto que Cristo dera fim, uma vez por todas, ao derramamento de sangue
referente à obra de redenção. À luz da Escritura, é inteiramente insustentável
a posição segundo a qual o batismo se relaciona com o Reino, e não com a
igreja, posição que, portanto, é judaica e não cristã. As próprias palavras da
instituição condenam esse conceito, e o mesmo se dá com o fato de que, por
ocasião do nascimento da igreja do Novo Testamento, Pedro exigiu dos que foram
acrescentados a ela que fossem batizados. E se se disser que Pedro, sendo
judeu, ainda seguia o exemplo de João Batista, pode-se assinalar que Paulo, o
apóstolo dos gentios, também exigia que os seus conversos fossem batizados, At
1615, 33; 18.8; 1 Co 1.16.
(2) Não há ordem explícita para que as crianças sejam
batizadas. Isto é perfeitamente certo, mas não refuta a validade do batismo de
crianças. Deve-se observar que esta objeção se baseia numa regra de
interpretação que os próprios batistas não seguem fielmente quando afirmam que
os cristãos têm o dever obrigatório de celebrar o primeiro dia da semana como o
seu Sabbath, ou seja, como o seu dia semanal de santo repouso, e que as
mulheres também podem participar da Santa Ceia; pois estas coisas não foram
ordenadas explicitamente. Poderia o silêncio da Escritura ser interpretado em
prol do batismo de crianças, e não contra? Durante vinte séculos as crianças
tinham sido iniciadas formalmente na igreja, e o Novo Testamento não diz que
isto agora deve cessar, ao passo que de fato ensina que a circuncisão não serve
mais para aquela finalidade. O Senhor Jesus instituiu pessoalmente outro rito,
e no dia de Pentecostes Pedro disse aos que se ajuntaram à igreja que a
promessa era para eles e para os seus filhos, e a quantos mais o Senhor
chamasse. Esta declaração de Pedro prova, no mínimo, que ele continua tendo em
mente a concepção orgânica da aliança. Além disso, pode-se levantar a questão
sobre como os batistas podem provar que a sua posição é correta citando uma
ordem expressa da Escritura. A Bíblia ordena em algum lugar que as crianças
sejam excluídas do batismo? Ordena ela que todos os que nascem e são criados em
famílias cristãs professem sua fé antes de serem batizados? É mais que patente
que não existem essas ordens na Bíblia.
(3) Uma objeção estreitamente relacionada com a
anterior é que não há exemplo de batismo de crianças no Novo Testamento. É
certo que a Bíblia não diz explicitamente que foram batizadas crianças, embora
nos informe que o rito foi ministrado a famílias inteiras. A ausência de
referências definidas ao batismo de crianças tem explicação, ao menos em boa
medida, no fato de que a Escritura nos dá um registro histórico da obra
missionária dos apóstolos, e não da obra empreendida nas igrejas organizadas.
Aí também o feitiço vira contra o feiticeiro, quanto aos batistas. Poderão
mostrar eles algum exemplo de batismo de um adulto nascido e criado num lar
cristão? Não há risco nenhum de que algum dia o façam.
(4) A objeção mais importante ao pedobatismo levantada
pelos batistas é que, de acordo com a Escritura, o batismo está condicionado a
uma fé ativa, que se revela numa profissão digna de crédito. Ora, é bem certo
que a Bíblia apresenta a fé como um requisito do batismo, Mc 16:16; At
10.44-48; 16.14, 15, 31, 34. Se isto significar que todo aquele que recebe o
batismo deve, em todos os casos, apresentar manifestações de fé ativa
antes do batismo, naturalmente as crianças estarão excluídas. Mas, embora a
Bíblia indique claramente que somente os adultos que criam eram batizados, em
parte nenhuma firma a regra de que uma fé ativa é absolutamente essencial para
receber-se o batismo. Os batistas nos remetem à grande comissão, nos termos de
Mc 16.15, 16. em vista do fato de que este é um mandado missionário, podemos
partir da suposição de que o Senhor tinha em mente uma fé ativa, ao dizer
aquelas palavras. E, apesar de não vir exposto explicitamente, é inteiramente
provável que Ele considerasse esta fé como um requisito da ministração do
batismo às pessoas em
vista. Quem são estas, porém?
Evidentemente, os adultos das nações que deviam ser
evangelizadas, e, daí, os batistas não têm base para entendê-lo como argumento
contra o pedobatismo. Se, não obstante, insistirem em faze-lo, dever-se-á
assinalar que, em sua interpretação, aquelas palavras provam demais em favor
deles, e, portanto, nada provam. As palavras do nosso Salvador implicam que a
fé é um requisito do batismo daqueles que, graças aos esforços missionários da
igreja, seriam levados a Cristo, e não implicam que também é um requisito do
batismo de crianças. Os batistas generalizam essa declaração do Salvador
ensinando que ela torna todo batismo dependente da fé ativa do batizando. Seu
argumento vai como segue: A fé ativa é o requisito do batismo. As crianças não
podem exercer fé. Portanto, as crianças não devem ser batizadas. Mas, dessa
maneira, essas palavras também podem ser elaboradas como argumento contra a
salvação de crianças, visto que elas não somente implicam, mas afirmam
explicitamente que a fé (fé ativa) é a condição para a salvação. Assim, o
batista que for coerente ver-se-á sob o peso do seguinte silogismo: A fé é a conditio
sine qua non (condição indispensável) da salvação. As crianças ainda não
podem exercer fé. Logo, as crianças não podem ser salvas. Mas esta é uma
conclusão da qual o próprio batista recua.*
(Berkhof, L. – Teologia Sistemática Pg641)
[1] The Church of Christ II , p. 98.
* Na expressão do tradutor desta obra, esse é um “silogismo,
que é o busílis acabrunhador dos batistas” (opúsculo intitulado O Batismo
Cristão, de Odayr Olivetti, Nanuque, MG, 6/10/1954, p. 15). Também é bom
transcrever aqui as palavras finais do referido opúsculo: “Não façamos da
Lógica trapézio, nem da Bíblia, mãe de sofismas. Busquemos nela a verdade e a
vontade de Deus, e não a mentira e a vontade dos homens. Deus permita que os
batistas sinceros possam ver a grande comissão de Jesus a Seus discípulos (Mc
16.15, 16), não uma fonte de discussões, confusões e contendas com outros
cristãos, mas sim a ordem de evangelização, de pregação do Evangelho puro e
repleto de amor, porque, como diz o Espírito Santo, pela boca do profeta e do
apóstolo: ‘Quão suaves são sobre os montes os pés do que anuncia as boas novas,
que faz ouvir a paz, que anuncia o bem, que faz ouvir a salvação, que diz a
Sião: O teu Deus reina!’ (Is 52.7); e ‘Quão formosos os pés dos que anunciam a
paz, dos que anunciam coisas boas!’ (Rm 10.15)”. Nota do tradutor.