(1) A Escritura fala de uma graça ou
misericórdia de Deus que é desde a eternidade, Sl 25:6; 103.17. Ora, toda graça
ou misericórdia que seja desde a eternidade tem que ter como sua base judicial
uma justificação que seja também desde a eternidade. Mas, em resposta a isto,
pode-se dizer que existem misericórdias e bondades eterna de Deus que não são
baseadas em nenhuma justificação do pecador, como, por exemplo, o Seu plano de
redenção, a dádiva de Seu Filho e a voluntária função de penhor exercida por
Cristo no pactum salutis.
(2) No pactum salutis a culpa dos
pecados dos eleitos foi transferida para Cristo, e a justiça de Cristo lhes foi
imputada. Quer dizer que o fardo do pecado foi retirado dos ombros deles e que
eles foram justificados. Pois bem, não há dúvida de que houve certa imputação
da justiça de Cristo ao pecador no conselho de redenção, mas nem toda imputação
pode ser chamada justificação, no sentido escriturístico do termo. Devemos
distinguir entre o que teve apenas um caráter ideal no conselho de Deus e
aquilo que se concretiza no transcurso da historia.
(3) O pecador recebe a graça inicial da
regeneração sobre a base da justiça de Cristo a ele imputada. Conseqüentemente,
os méritos de Cristo têm que lhe ser imputados antes da sua regeneração. Mas
apesar desta consideração levar à conclusão de que a justificação precede
logicamente à regeneração, isto não prova a prioridade cronológica da
justificação. O pecador não pode receber a graça da regeneração com base numa
justificação existente idealmente no conselho de Deus e que conta com a certeza
de que se concretizará na vida do pecador.
(4) As crianças também precisam da
justificação, para serem salvos, e, todavia, é-lhes totalmente impossível
experimentar a justificação pela fé. Mas, embora seja mais que certo que as
crianças que ainda não atingiram a maturidade não podem ter experiência da
justificação passiva, podem ser justificados ativamente no tribunal de Deus e,
assim, podem ter posse daquilo que é absolutamente essencial.
(5) A justificação é um ato imanente de
Deus e, como tal, só pode ser oriundo da eternidade. Não é bem correto, porém,
falar da justificação como um actus immanens (ato imanente) em Deus; é,
antes, um actus transiens (ato transitivo), exatamente como a criação a
encarnação e outros mais. Os defensores da justificação desde a eternidade vêem
o peso desta consideração e, daí, apressam-se a garantir-nos que eles não
pretendem ensinar que os eleitos são justificados desde a eternidade actualiter
(em termos de ação concretizada), mas unicamente na intenção de Deus, no
decreto divino. Isto nos leva de volta à distinção usual entre o conselho de
Deus e sua e sua execução. Se esta justificação presente na intenção de Deus
nos permite falar de uma justificação desde a eternidade, então não há
absolutamente nenhum motivo pelo qual não devamos falar também de uma criação
desde a eternidade.
(Teologia Sistemática –
Louis Berkhof Pg. 519)