Conceitos
Divergentes de Regeneração.
1. CONCEITO PELAGIANO. De acordo com os
pelagianos, a liberdade e a responsabilidade pessoais do homem implicam que
ele, em todos os tempos, tanto é capaz de desistir de pecar como de cometer
pecado. Somente os atos de volição consciente são tidos como pecados. Em
conseqüência, a regeneração consiste simplesmente numa reforma moral. Quer
dizer que o homem, que antes optou pela transgressão da lei, agora opta por
viver em obediência.
2. REGENERAÇÃO BATISMAL. Esta nem sempre é
apresentada do mesmo modo.
a. Na Igreja de Roma. Segundo a
Igreja Católica Romana, a regeneração inclui, não somente a renovação
espiritual, mas também a justificação ou o perdão, e é efetuada por intermédio
do batismo. No caso das crianças, a obra de regeneração é sempre eficaz; não
assim no caso dos adultos. Estes podem prazerosamente aceitar e utilizar a
graça da regeneração, mas também podem resistir-lhe e torna-la eficaz. Além
disso, é sempre possível que aqueles que se apropriam dela venham a perde-la de
novo.
b. Na Igreja Anglicana. A Igreja da
Inglaterra não é unânime sobre este ponto, apresentando duas tendências
diferentes. Os puseytas, assim chamados, concordam no essencial com a igreja de
Roma. Mas há também uma influente parte da igreja que distingue duas espécies
de regeneração: uma consiste meramente numa mudança da relação da pessoa com a
igreja e com os meios de graça; a outra, numa mudança fundamental da natureza
humana. De acordo com este grupo, somente a primeira delas é efetuada pelo
batismo. Esta regeneração não inclui nenhuma renovação espiritual. Por meio
dela, o homem apenas entra numa nova relação com a igreja, e se torna filho de
Deus no mesmo sentido em que os judeus se tornaram filhos de Deus pela aliança,
cujo selo era a circuncisão.
c. Na Igreja Luterana. Lutero e seus
seguidores não conseguiram purificar a igreja do fermento de Roma sobre este
ponto. De modo geral, os luteranos defendem, em oposição a Roma, o caráter
monergista da regeneração. Consideram o homem inteiramente passivo na
regeneração e incapaz de contribuir com alguma coisa para ela, embora os
adultos lhe possam fazer resistência por muito tempo. Ao mesmo tempo, alguns
ensinam que o batismo, agindo ex opere operato, é o meio usual pelo qual
Deus efetua a regeneração. È o meio usual, mas não o único, pois a
pregação da Palavra também pode produzi-la. Falam eles de duas espécies de
regeneração, quais sejam, a regeneratio prima (primeira
regeneração), pela qual a nova vida é gerada, e a regeneratio secunda
(segunda regeneração, ou renovação), pela qual a nova vida é conduzida em
direção a Deus. Enquanto que as crianças recebem a regeneratio prima por
meio do batismo, os adultos, que recebem a primeira regeneração por meio da
Palavra, tornam-se participantes regeneratio secunda através do batismo.
Segundo os luteranos, a regeneração pode ser perdida. Mas, pela graça de Deus,
pode ser restabelecida no coração do pecador penitente, e isto sem rebatismo. O
batismo é um penhor da continuada prontidão de Deus para renovar o batizado e
perdoar os seus pecados. Além disso, nem sempre a regeneração é realizada
completa e imediatamente, mas muitas vezes é um processo gradual na vida dos
adultos.
3. O CONCEITO ARMINIANO. De acordo com os
arminianos, a regeneração não é exclusivamente obra do homem. É fruto da
escolha do homem, pela qual ele se decide a cooperar com as influências divinas
externas por meio da verdade. Estritamente falando, a obra do homem é anterior
à de Deus. Os arminianos não admitem que haja uma obra prévia de Deus pela qual
a vontade é inclinada para o bem. Naturalmente, eles acreditam também que se
pode perder a graça da regeneração. Os arminianos wesleyanos alteraram este
conceito no sentido de que salientam o fato de que a regeneração é obra do
Espírito, ainda que em cooperação com a vontade humana. Eles admitem uma
operação prévia do Espírito Santo para iluminar, despertar e atrair o homem.
Contudo, eles também acreditam que o homem pode resistir a esta obra do
Espírito Santo, e que, enquanto resistir, permanecerá em sua condição não
regenerada.
4. O CONCEITO DOS TEÓLOGOS MEDIATÁRIOS.
Este conceito segue modelo panteísta. Após a encarnação, não existem duas
naturezas separadas em Cristo, mas somente uma natureza divino-humana, uma
fusão da vida divina e humana. Na regeneração, uma parte dessa vida
divino-humana é introduzida no pecador. Isto não requer operação separada do
Espírito Santo toda vez que se regenera um pecador. A nova vida foi comunicada à
igreja uma vez por todas, é agora uma permanente possessão da igreja, e passa
da igreja para o indivíduo. A comunhão com a igreja também garante a
participação da nova vida. Este conceito ignora inteiramente o aspecto legal da
obra de Cristo. Além disso, torna impossível afirmar que alguém pôde ser
regenerado antes de vir à existência a vida divino-humana de Cristo. Os santos
do Velho Testamento não puderam ser regenerados. O pai desta idéia é
Schleiermacher.
5. O CONCEITO TRICOTÔMICO. Alguns teólogos
elaboraram uma peculiar teoria da regeneração baseados no conceito tricotômico
da natureza humana. Este conceito parte do pressuposto de que o homem consiste
de três partes – corpo, alma e espírito. Geralmente se admite, embora haja
variações sobre este ponto, que o pecado tem sua sede somente na alma, e não no
espírito (pneuma). Se tivesse penetrado o espírito, o homem estaria
irremediavelmente perdido, exatamente como os demônios, que são seres puramente
espirituais. O espírito é a vida superior e divina do homem, destinada a
dominar e dirigir a vida inferior. Pela entrada do pecado no mundo, a
influencia do espírito sobre a vida inferior é por demais enfraquecida; mas,
pela regeneração é fortalecida novamente, e se restabelece a harmonia na vida
do homem. Esta é, naturalmente, uma teoria puramente racionalista.[1]
6. O CONCEITO DO LIBERALISMO MODERNO. Os
teólogos “liberais” dos dias atuais não têm todos o mesmo conceito de
regeneração. Alguns falam em termos que lembram o conceito de Schleiermacher.
Mais geralmente, porém, eles defendem uma idéia puramente naturalista. São
avessos à idéia de a regeneração é uma obra sobrenatural e recriadora de Deus.
Em virtude do Deus imanente, todo homem tem em si um princípio divino e, assim,
possui potencialmente tudo que é preciso para a salvação. A única coisa
necessária é que o homem tome consciência da sua divindade potencial, e que se
submeta conscientemente à direção do princípio superior que nele há. A
regeneração é uma simples mudança ética no caráter.
QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Que outros
termos e expressões a Bíblia usa para designar a obra da regeneração? 2. A Bíblia distingue
nitidamente entre vocação, regeneração, conversão e santificação? 3. Como
explicar que a Igreja Católica Romana inclui até a justificação na regeneração?
4. Como diferem a regeneração e a conversão? 5. Existe o que chamam de graça
proveniente, que antecede a regeneração e prepara para ela? 6. O que é a
regeneração ativa, em distinção da regeneração passiva? 7. A passividade do homem na
regeneração dura algum tempo? 8.
A idéia de que a Palavra de Deus não é instrumento para
a efetuação da regeneração faz a pregação da Palavra parecer fútil e
completamente desnecessária? 9. Isto não leva às bordas do misticismo?
BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Kuiper, Dict.
Dogm., De Salute, p. 70-83; ibid., Het Werk van den Heiligen
Geest II, p. 140-162; Bavinck, Geref. Dogm. IV, p. 11-82; ibid., Roeping
en Wedergeboorte; Mastricht, Godgeleerdheit VI, 3; Dick, Theology,
Lect. LXVI; Shedd, Dogm. Theol.II, p. 490-528; Dabney, Syst. And
Polem. Theol., Lect. XLVII: Vos, Geref. Dogm. IV, p. 32-65; Hodge, Syst.
Theol. III, p. 1-40; McPherson, Chr. Dogm., p. 397-401; Alexander,
Syst. Of Bib. Theol. II, p. 370-384; Litton, Introd. to Dogm. Theol.
II, p. 313-321; Schmid, Doct. Theol. of the Ev. Luth. Church, p.
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II, p. 344-359; Pope, Chr. Theol. III, p. 5-13; Strong, Syst. Theol.,
p. 809-828; Boyce, Abstract of Syst. Theol., p. 328-334; Wilmers, Handbook
of the Chr. Rel., p. 314-322; Anderson, Regeneration.
(Teologia Sistemática – Louis Berkhof.
Pg. 477)