quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Conceitos Errôneos da União Mística

Existem várias concepções errôneas da união mística, contra as quais devemos estar vigilantes. Erros sobre este ponto não devem ser considerados como inconseqüentes e, portanto, desimportantes, pois eles acarretam perigo quanto ao bom entendimento da vida cristã.

1. ERRO RACIONALISTA. Devemos evitar o erro dos racionalistas que costumam identificar a união mística com a união de Cristo como o Logos com toda a criação ou com a imanência de Deus em todos os espíritos humanos. Vê-se isto na seguinte afirmação que A.H.Strong cita de Campbell, The Indwelling Christ (O Cristo que em nós habita): “Na imanência de Cristo na natureza vemos a base da Sua imanência na natureza humana. ... Um homem pode estar fora de Cristo, mas Cristo nunca está fora dele. Ele não abandona aqueles que O banem”. Neste conceito, a união mística fica privada da sua significação soteriológica.

2. ERRO MÍSTICO. Outro erro perigoso é o dos místicos, que entendem a união mística como uma identificação do crente com Cristo. De acordo com este conceito, há nela uma união de essência, na qual a personalidade de um simplesmente se funde na do outro, de maneira que Cristo e o crente não permanecem como pessoas distintas. Mesmo alguns luteranos chegaram a esse extremo. Houve um extremista que não hesitou em dizer: “Eu sou Cristo Jesus, a Palavra de Deus viva; eu te redimi pelos meus sofrimentos sem pecado”.

3. ERRO SOCINIANO E ARMINIANO. No outro extremo acham-se os ensinos dos socinianos e arminianos, que apresentam a união mística como simples união moral, ou como uma união de amor e simpatia, como a que existe entre um professor e os seus alunos, ou entre amigo e amigo. Tal união não envolve nenhuma interpenetração da vida de Cristo e a dos crentes. Envolveria nada mais que uma amorosa adesão a Cristo, um serviço amigável prestado gratuitamente a Ele, e a pronta aceitação da mensagem do reino de Deus. É uma união que não requer um Cristo em nós.

4. ERRO SACRAMENTALISTA. Outro erro a evitar-se é o dos sacramentalistas, representados pela Igreja Católica Romana e por alguns luteranos e episcopais da alta igreja. Strong fala deste erro como sendo “talvez a mais perniciosa interpretação da natureza desta união”. Ela faz da graça de Deus uma coisa substancial, da qual a igreja é a depositária, e que pode ser transmitida aos sacramentos; e perde completamente a noção do fato de que os sacramentos não podem efetuar esta união, porquanto já a pressupõem.

D. Significado da União Mística.


1. A união mística, no sentido em que dela falamos agora, não é o fundamento judicial sobre cuja base nos tornamos partícipes das riquezas que há em Cristo. Às vezes se diz que os méritos de Cristo não nos poderão ser imputados enquanto não estivermos em Cristo, desde que somente com base em nossa unidade dom Cristo é que tal imputação pode ser razoável. Mas este conceito deixa de distinguir entre a nossa unidade legal e a nossa unidade espiritual com Cristo, e é uma falsificação do elemento fundamental da doutrina da redenção, qual seja, a doutrina da justificação. A justificação é sempre uma declaração de Deus não com base numa condição existente, mas ma de uma graciosa imputação – declaração que não está em harmonia com a existente condição do pecador. O fundamento judicial de toda a graça especial que recebemos jaz no fato de que a justiça de Cristo nos é imputada livremente.

2. Mas este estado de coisas, a saber, que o pecador nada tem em si mesmo e recebe tudo livremente de Cristo, deve refletir-se na consciência do pecador. E isso tem lugar pela mediação da união mística. Se bem que a união é efetuada quando o pecador é renovado pela operação do Espírito Santo, ele não terá conhecimento dela e não a cultivará enquanto não começar a operação pela fé. Então ele fica ciente de que não possui justiça própria, e de que a justiça pela qual ele é visto como justo diante de Deus lhe é imputada. Mas mesmo assim, requer-se algo adicional. O pecador deve sentir sua dependência de Cristo nas profundezas do seu ser – em sua vida subconsciente. Daí ele é incorporado a Cristo e, como resultado, percebe que toda a graça que ele recebe flui de Cristo. O constante sentimento de dependência assim gerado, é um antídoto contra toda justiça própria.

3. A união mística com Cristo também assegura para o crente o poder continuamente transformador da vida de Cristo, não somente na alma, como também no corpo. A alma se renova gradativamente, à imagem de Cristo, como Paulo o expressa em 2 Co 3.18: “somos transformados de glória em glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito”. E o corpo é consagrado no presente, para ser um bom instrumento da alma renovada, e por fim será elevado à semelhança do corpo glorificado de Cristo, Fp 3.21. Estando em Cristo, os crentes compartem todas as bênçãos que Ele mereceu para o Seu povo. Ele é para os Seus um manancial perene a jorrar para a vida eterna.

4. Em virtude desta união, os crentes têm comunhão com Cristo. Exatamente como Cristo participou dos labores, dos sofrimentos e das tentações do Seu povo, este agora é levado a participar das Suas experiências. Em certa medida, os Seus sofrimentos se reproduzem e se completam nas vidas dos Seus seguidores. Estes são crucificados com Ele, e também ressuscitam em novidade de vida. A vitória final de Cristo é também a vitória deles. Ver Rm 6.5, 8; 8.17; 2 Co 1.7; Fp 3.10; 1 Pe 4.13.

5. Finalmente, a união dos crentes com Cristo fornece a base para a unidade espiritual de todos os crentes, e, conseqüentemente, para a comunhão dos santos. Eles são animados pelo mesmo espírito, ficam cheios do mesmo amor, permanecem na mesma fé, empenham-se na mesma luta, e estão ligados pelo mesmo objetivo. Juntos estão interessados nas coisas de Cristo e Sua igreja, nas coisas de Deus e do Seu reino. Ver Jo 17.20, 21; At 2.42; Rm 12.15; Ef 4.2, 3; Cl 3.16; 1 Ts 4.18; 5.11; Hb 3.13; 10.24, 25; Tg 5.16; 1 Jo 1.3, 7.

QUESTIONÁRIO PARA PESQUISA: 1. Qual o sentido do termo “mística” como é ele aplicado à união com Cristo? 2. Qual a relação entre a graça na esfera legal e a graça na esfera moral? 3. Como responder à asseveração de que o pecador não pode participar das bênçãos da graça especial de Deus, enquanto não for incorporado subjetivamente a Cristo? 4. Que se pode dizer em réplica à asserção de que a fé precede à regeneração porque efetua a união com Cristo, quando a regeneração é fruto desta união? 5. A união mística suprime ou preserva a personalidade do homem? Cf. Ef 4.13. 6. Todos os crentes auferem benefícios iguais desta união? 7. Se esta união é indissolúvel, como entender Jo 15.1-7? 8. Como Schleiermacher concebe a união do crente com Cristo?

BIBLIOGRAFIA PARA CONSULTA: Bavinck, Geref. Dogm. III, p. 594, 595; IV, p. 114, 226, 227, 268, 269; Kuyper, Het Werk van den Heiligen Geest II, p. 163-182; Dabney, Syst. and Polem. Theol., p. 612-617; Strong, Syst. Theol., p. 795-808; Dick. Theol., p. 36-365; Hodge, Outlines, p. 482-486; ibid., The Atonement, p. 198-211; McPherson, Chr. Theol., p. 402-404; Valentine, Chr. Theol. II, p. 275-277; Schhmid, Doct. Theol. p. 485-491; Litton, Introd. to dogm. Theol., p. 321,322.
(Teologia Sistemática – Louis Berkhof. Pg. 449)